Ergo sum.
Seria uma noite comum, seria uma noite qualquer.
Fui ao banheiro lavar o rosto e escovar os dentes antes de dormir, quando me deparo com o estranho do outro lado da lâmina com uma camada de amálgama de estanho. O desgraçado me olhava com desprezo tendo o cano de uma Walther P22, alongado com um silenciador, apontado para minha cara. Óbvio que olhei para trás e não tinha ninguém, mas não havia como, eu o via a minha frente. Sua postura era completamente outra e esbanjava um sorriso malicioso no rosto. Sua camisa preta dobrada até os cotovelos passava uma elegância agressiva e seu cabelo arrepiado com pasta definia sua aura orgulhosa.
Perguntei o que ele queria, não obtive resposta.
Eu sabia o que ele queria. Ali, curvado lavando o rosto e me olhando de baixo para cima. Sequer para se levantar e me encarar nos olhos, me confrontar. De braço estendido o encaro nos olhos profundos e frágeis. Pediria para virar homem, se ao menos isso fosse capaz. Apenas esperava algo acontecer enquanto a água lhe escorria do rosto. Passivo. Reativo, como um pequeno animal. Não seria fácil fazê-lo, mas tinha de ser feito. De cabelo ensebados e espinhas estouradas seu rosto agora demonstrava o pavor que escondia, e em segundos já havia perdido o controle. Entre súplicas veio o desespero, quebrando tudo e tentando despedaçar a fina camada de vidro que nos distanciava.
Um baque. Os cacos de vidro caem lentamente. Um tiro. Da visão fragmentada vejo-o deitado do outro lado. Está feito, guardo a arma, estalo os dedos e o pescoço.
Depois arrumo esta bagunça.
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